Independência do Banco Central e inconsistência dinâmica

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Ontem (08), o mercado financeiro amanheceu com a notícia de uma reunião entre Paulo Guedes (Ministro da Economia), Roberto Campos Neto (Diretor do Banco Central) e relator do projeto de independência do Banco Central, Silvio Costa Filho, para discutirem o projeto. Apesar de haver mais avanços neste ano, a discussão é antiga no Brasil e também no exterior.

No Brasil, a discussão teve início após a estabilização econômica em 1994 com a lei a Lei nº 8.880, de 27/05/1994, na qual é discutida as funções do Banco Central e, com qual seria o nível ideal de independência do Banco Central, gerando a discussão entre diferentes linhas de economistas. Os chamados de monetaristas defendem que o compromisso da Autoridade Monetária tem a função exclusiva de estabilidade monetária, os economistas desenvolvimentistas ou heterodoxos consideram que a política monetária deve estar comprometida com o desenvolvimento econômico do país e seguir a conjuntura econômica em atual.

Dentre essas duas abordagens o mercado tende a considerar ortodoxa, isto é, monetarista com foco para a estabilidade monetária. Além disso, o mercado vê com bons olhos uma maior independência do Banco Central, se baseando em argumentos baseados em problemas de conflito de interesse ou de ruídos de expectativas que serão abordados abaixo.

Inconsistência dinâmica

Um dos principais problemas referentes as decisões do Banco Central e condução da política monetária é o que a teoria econômica chama de inconsistência dinâmica. A inconsistência dinâmica é um problema advindo de anúncios do diretor do banco central que influenciam as expectativas dos agentes, ou seja, famílias, empresas e investidores de modo geral. Após o anúncio do Banco Central, por exemplo, em um comunicado que indica uma política monetária com vês de políticas buscando o controle da inflação, esses agentes acabam internalizando o anúncio. Todavia, posteriormente o BC acaba tomado outra atitude, um “desvio” que foge do anúncio inicial.

O “desvio” por parte da autoridade monetária, faz com que ele tenha um benefício de curto prazo, pois ele pode ter vantagens relacionadas ao governo como a manutenção do formulador de política no cargo, atendendo questões relacionados à política. Por exemplo, para fins de melhorar a situação do governo em relação ao aumento ao câmbio ou à quantidade de dinheiro na economia, o banqueiro central pode conduzir a política monetária em linha com maior popularidade do governo, deixando o câmbio abaixo em relação ao de equilíbrio ou taxa de juros muito baixas com o objetivo de haver maior quantidade de dinheiro na economia, mesmo que não seja acompanhado por um aumento na produtividade, gerando estímulo à economia1.

Trade Off da autoridade monetária e preços

Apesar de no curto prazo a autoridade monetária ter algum tipo de vantagem em relação à aplicação de uma política monetária, é de que o banqueiro central pode ter ganhos junto ao governo. Todavia, no longo prazo, a autoridade monetária perderá perder sua confiabilidade, tirando toda credibilidade do Banco Central, afetando as expectativas dos agentes. Caso o Banco Central se comprometa com uma taxa de inflação igual a zero, é normal que o os agentes tenham uma expectativa de inflação igual a zero e, na ausência de choques sistêmicos, a taxa de desemprego atual tende a ser igual a natural.

Assim, os agentes formuladores de preços e salários, quando ocorre o problema de inconsistência, o Banco Central pode tentar estimular a demanda agregada fazendo com que a taxa de desemprego seja menor que a natural, fazendo com que os salários estejam acima do equilíbrio, afetando os demais preços da economia. Logo, no limite, se os agentes internalizarem, ou seja, sempre considerarem uma inflação maior que a anunciada, a queda no desemprego não gera benefícios efetivos, mas apenas perdas relacionadas ao aumento de inflação.

O BC independente como forma de diminuir a ID

Uma das formas de diminuir o problema de inconsistência dinâmica é tendo um Banco Central independente. Isso acontece porque a independência do Banco Central impede a que a autoridade monetária tenha influência do governo em suas decisões. De modo geral, o interesse do governo influencia as decisões econômicas em vários aspectos, como observado por James McGill Buchanan Jr, os governos tendem a tomar políticas econômicas que os beneficiem, inclusive em momentos específicos, criando ciclos econômicos “artificiais” que ele chamou de Political Business Cycle, como comentamos no texto “A questão fiscal e a bolsa de valores”.

Assim, como ocorre do lado fiscal, se o Banco Central não for independente, ele tenderá a cometer os desvios em favor das preocupações de curto prazo do governo. Uma das experiências recentes que mostraram a importância de Bancos Centrais Independentes, foi entre a crise financeira de 2008 e seus anos subsequentes, como destaca Ben S. Bernanke em seu comunicado de 25 de maio de 2010 “Central Bank Independence, Transparency, and Accountability”. No entanto, como defende Bernanke no artigo, a independência do Banco Central não total, de modo que não haja prestação de contas por ao público em relação aos seus objetivos.

Política monetária com regras

Além da independência do BC, há a possibilidade de seguir uma política monetária com regras. A regra mais utilizada é a Regra de Taylor, onde a taxa de juros estabelecida pelo BC depende do hiato inflacionário e do hiato do produto. 

  • Onde aπ é a ponderação para o hiato inflacionário
  • (π – π*) é o hiato inflacionário sendo que π é a inflação atual e π* é a inflação esperada.
  • ay é a ponderação para o hiato do produto.
  • (Y – Y*) é o hiato do produto sendo que Y é a produto atual e Y* é o produto esperado.

No caso da regra, apesar de não permitir desvios do Banco Central, ela tem um ponto negativo. Em momentos de choques sistêmicos, a autoridade monetária fica presa para tomar suas decisões, alocando variáveis discricionárias, como foi o caso da aplicação recente do foward guidance na condução da política monetária. Assim, é possível que exista um Trade-off entre as duas modalidades de aplicação de política monetária de modo que exista momentos e situações que as regras são melhores que a discrição e em outros momentos a uma política baseada em discrição pode ser o mais adequado, como especificam Barro & Gordon no artigo “RULES, DISCRETION AND REPUTATION IN A MODEL OF MONETARY POLICY” de 1983.

Políticas descritivas

Por outro lado, as políticas descritivas precisam ter certa cautela, pois quando a política descritiva é usada consistentemente, o formulador de política monetária tende ser tentado a usar “desvios”, como argumenta Kydland e Prescott em “Rules Rather than Discretion: The Inconsistency of Optimal Plans” de 1977. Além disso os economistas argumentam no artigo que o formulador de política econômica se sente tentado, não por ser mal, mas pelo fato de sua utilidade, no curto prazo, aumentar quando há discrição e ver maior liberdade para atuar. Logo, apesar dos problemas advindos da política de regras em momentos de choques sistêmicos, para minimizar o problema de inconsistência dinâmica, a utilização de regras acaba sendo mais eficiente, compensando os problemas inflacionários que podem ser gerados pela discrição como apontado por Kenneth Rogoff quando escreveu o artigo “The Optimal Degree of Commitment to an Intermediate Monetary Target” de 1985.

Banqueiro central avesso à inflação

Nesse caso, mesmo que o BC não seja independente, a escolha de um de indivíduo conservador e avesso à inflação e que tenha pouca motivação de reduzir o nível de emprego com o aumento da oferta de moeda, o que Rogoff também defende em seu artigo de 1985. Apesar de ser algo subjetivo, essas características podem ser evidenciadas pelo histórico do possível banqueiro central, suas posições em relação ao tema ao longo de sua carreira, publicações e periódicos por exemplo.  

Ganho de reputação

Apesar de ser mais sensível em relação as demais soluções, o ganho de reputação também é uma hipótese interessante, pois está relacionada com a utilidade futura dos agentes econômicos, mais especificamente, do banqueiro central. Assumindo uma postura crível, sem desvios, o formulador da política monetária aumenta sua utilidade de longo prazo em detrimento de ter os benefícios de cometer o desvio no curto prazo. Contudo, tal situação ocorre de forma cooperativa com a sociedade, pois se o BC se desviar de seu compromisso, o mercado e os demais agentes econômicos internalizarão tal atido, criando expectativas negativas em relação à autoridade monetária, ou seja, falta de credibilidade.

Conclusão

Podemos concluir, por intermédio de várias abordagens, que existem inúmeras formas de conduzir a política monetária sem que exista vieses e ruídos de informação que afetem as expectativas dos agentes e, dentre elas, a independência do Banco Central acaba sendo uma alternativa muito usada e discutida no Brasil no Mundo. A experiência recente mostra que tal alternativa se mostra vantajosa, inclusive em momentos de crise, fazendo com que a política monetária esteja comprometida com o longo prazo.

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Autor: Matheus Jaconeli

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